Coletânea de Mitos Africanos – Terceira Parte

por DiomedesRJ

Ponha Amor em suas Obras

O jovem Bessen, filho da Deusa Nanã, era um Deus muito ocupado. Ele tinha a função, de levar as águas da Terra, para o Céu, para que a chuva pudesse acontecer. Mas seu trabalho nunca terminava, pois quando ele achava que já tinha levado água suficiente para cima, a chuva vinha, e devolvia a água para a Terra. Ainda sim, era um trabalhador muito cuidadoso, pois ele tinha todo o cuidado de não deixar cair nenhuma gota, de dentro das cabaças que ele usava para recolher a água.

Mas ele se incomodava mais ainda, com o fato de achar a Terra um lugar muito sem cor, e sem graça, mesmo sendo dono de roupas muito coloridas e vibrantes.

Um dia, particularmente incomodado com seu trabalho, ele se distraiu, e deixou algumas das cabaças que ele levava derramarem algumas gotas, poucas, mais vindo de muitos vasilhames, formaram uma fina garoa.

Bessen (também chamado de Oxumarê), achando que seria punido por seu descuido, achou, ao invés disso, a resposta que procurava. No lugar onde passava, se formou um longo Arco, todo colorido e iluminado. Notou então, que as gotas que deixara cair, estavam refletindo a cor de suas roupas para a Terra.

Viu ele então, que passou a acertar em sua função, apenas quando ele aparentemente errou, pois não é o apuro e o acerto que fazem seu trabalho ter excelência, mas sim o amor que você dedica ao que você faz.

 

Não há Justiça sem Misericórdia

Xangô, divindade que presidia a Justiça, e Rei de Oyó, a maior nação iorubá, estava preocupado em sua corte. Seu reino sofria a maior invasão, desde que foi coroado.

Era um exército cruel, que atacava vilarejos, e seus soldados batedores, deixando apenas uma trilha de destruição e corpos mutilados. Seus soldados, que vigiavam as fronteiras, eram devolvidos em pedaços, para suas famílias, conforme os invasores avançavam.

A resposta era clara – ele deveria reunir seu exército, e esmagar os invasores. No entanto, procurando o conselho de Ifá, antes de partir, foi avisado pelo Oráculo, a subir numa montanha, e observar o inimigo, antes de agir.

Assim fazendo, posicionou seus homens sobre um monte pedregoso, enquanto os invasores, muito numerosos, mais do que seus próprios soldados, avançavam. Os guerreiros de Oyó estavam inquietos. Aguardavam a ordem para descer e atacar. Mas Xangô apenas olhava, e olhava, para o inimigo que avançava.

Quando o Rei de Oyó se moveu, não foi uma ordem que ele deu. Ele ergueu sua arma pessoal, o Oxê, um machado feito de pedra, e golpeou repetidamente as pedras abaixo de si. Havia invocado seu poder mais terrível, o Raio.

Faíscas saíram das pedras, e os raios se dirigiram para os comandantes do exército inimigo, fulminando a todos. Em poucos instantes, o exército inimigo estava aterrorizado, seus líderes mortos em segundos. Os soldados prontamente se renderam a Oyó.

Xangô e seus soldados desceram enfim do monte, e quando seus homens correram para matar os que se renderam, o Deus do Trovão rugiu um sonoro “NÃO!” aos seus soldados.

“Vocês não foram capazes de ver. Mas eu vi. Os líderes ameaçavam continuamente os soldados que se renderam aqui. Governavam seus homens pelo terror, e não por autoridade. Os comandantes eram cruéis e maus, mas estes soldados, apenas cumpriram ordens, para que eles mesmos não fossem mortos.”

“Desarmem-nos e deixem-os ir em paz. Mas que estejam avisados que se retornarem a Oyó com propósito de guerra, não terão mais minha piedade.”

Diante da decisão de Xangô, os homens não apenas se renderam, mas ofereceram sua lealdade ao Rei de Oyó. Os soldados do Grande Reino, aprenderam nesse dia, que não se pode fazer Justiça, sem estar disposto a oferecer Misericórdia, e considerar a culpa, conforme a participação.

 

Reflita sobre o que Criticas

Uma grande festa foi dada, um dia, para os Deuses, onde apenas os mais Antigos não puderam comparecer. Os homens ofereceram muita música, comidas e alegria, para as entidades que conservavam a ordem do mundo.

Deusas e Deuses foram dançando uns com os outros, formando belos pares em seu balé. Mas um, desde a chegada, não conseguia par.

Todos sabiam da história de Omolu. Ele adoecera muito jovem, de doença que o cobria de chagas purulentas, e ele andava com o corpo coberto por uma roupa longa de palha da costa, para esconder sua fealdade. Por isso, nenhuma Deusa queria o Senhor da Pestilência como seu par. Até os Deuses evitavam se aproximar dele.

Uma das últimas damas a chegar, porém, mudaria isso radicalmente.

Oyá, a Deusa dos Ventos, Rainha de Oyó ao lado de Xangô, mas com suas próprias idéias e decisões, entrou na festa com sua natural animação, dando ainda mais cor ao baile. E estranhou, depois de um tempo, ao ver Omolu sozinho.

Uma brisa soprou do Deus para ela, chamando a atenção do mesmo, e ela o convidou ao centro da pista. E todos se espantaram ao ver os dois dançarem juntos, dois compassos diferentes se somando perfeitamente.

Quando enfim se afastaram, Oyá foi questionada se ela não teve horror, de se aproximar de um ser doente e feio como Omolu. Com o rosto mais fechado, mas um sorriso de canto de boca, disse, com seu tom de voz costumeiramente alto:

“O Vento me disse tudo o que eu precisava saber sobre ele. Mas eu dançaria com ele, mesmo que fosse tudo aquilo que vocês pensam. O fardo dele é um dos mais pesados de todos nós, e ele precisa desse momento de descontração e alegria, e eu daria isso a ele, sem hesitar. Agora, eu lhes mostrarei o tamanho da tolice de vocês!”

Oyá agitou sua saia, invocando seu Elemento, e uma lufada de vento levantou a palha do corpo de Omolu. E todos viram o que a Rainha de Oyó sabia: Omolu era um homem belíssimo, e já curado de sua doença, usando apenas a palha, para honrar o cuidado que sua mãe lhe deu quando jovem.

“Tudo o que um ser é, tem seu próprio cheiro. E o dele, não tinha nada de desagradável… Agora, me deem licença, pois segundo Omolu, serei o único par dele, neste baile!”

Principalmente, as jovens Deusas presentes, aprenderam a lição de que decisões tomadas sobre o que se sente, sem lógica ou informação apoiando, sempre levavam ao erro. E a perder o melhor partido de uma festa, também.

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Este gesto de Oyá, lhe fez ganhar de Omolu, um presente único. Mas isso, é uma outra história.

omolu

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